Vitória Cribb

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Como foi seu processo de inserção no mundo da arte? Como ele começou?
[VC]
Meu processo de inserção foi de maneira bem experimental. Em 2015 comecei a explorar o universo 3D digital e como representar questões inerentes a mim e ao meu subconsciente, a partir daí comecei a desenvolver uma linguagem 3D que é o núcleo da minha prática mas se desdobra em outras formas de representação.
Vitória Cribb, [stills] @ilusão - Video, 2020 Triha- OLHO
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Conte um pouco mais sobre seu processo de criação virtual tridimensional, como começou e como está atualmente?
[VC]
Meu processo de criação virtual foi totalmente experimental, eu tive um contato maior com edição de vídeo e fotos na faculdade e entre 2015/16 comecei a explorar a técnica 3D de forma muito pessoal e técnica. Atualmente esse processo tridimensional e digital tange tanto a minha prática artística pessoal quanto a minha prática como designer, mas sigo em uma constante evolução, investigando a melhor maneira de aplicar essa visualização aos meus pensamentos e formulações.
Vitória Cribb, [stills] @ilusão - Video, 2020 Triha- OLHO
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Um dos pontos da sua pesquisa é o corpo da mulher negra, comente um pouco sobre o desenvolvimento desse assunto e o que a construção desses corpos significa para você.
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Acredito que a possibilidade de explorar a construção conceitual da imagem humana já consolidada e datada pela esfera midiática me instiga a representar visualmente algo tão próximo do real e tão distante da nossa integridade física, assim como investigar conceitualmente os papéis sociais de corpos negros e femininos analogicamente à existências/consciências tecnológicas exploradas para o desenvolvimento em uma sociedade acelerada e hiper-produtiva. Como a exemplo do vídeo Prompt de Comando, 2019, onde através de um vídeo poema audiovisual traço um paralelo e me questiono sobre a minha condição enquanto mulher negra ou como robô.
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Boa parte do seu trabalho se constrói através do meio digital, além desse ser o suporte de sua pesquisa ele é, também, onde a forma e o conceito se desenvolvem. Comente um pouco sobre a sua relação com questões intrínsecas às mídias, como algoritmo, código, looping, entre outros.
[VC]
Sim, para além da estética visual e sensorial digital presente no meu trabalho, investigo processos tecnológicos e virtuais que vão de encontro com a realidade natural e orgânica. A digitalização de processos, comunicação, relação e informação é algo presente no funcionamento da nossa sociedade atual e já naturalizada em âmbitos íntimos. Investigo justamente esse elo relação presente entre o que entendemos e ainda separamos como máquina/esfera cibernética e a existência natural. No trabalho @ ilusão abordo o algoritmo como motor da sociabilização entre seres humanos, por exemplo assim como faço uma analogia entre a hiper-produção da máquina/computador com a vivência de uma mulher negra na nossa sociedade no trabalho Prompt de Comando, 2019 e no vídeo Anthozoa, 2020 onde investigo o loop como uma característica presente à nossa estrutura de vida social.
Vitória Cribb, Prompt de Comando, 2019
[TT]
Para você, qual a relação entre esse modelo de estruturação das mídias e a manutenção dos abismos sociais e raciais?
[VC]
É importante trazermos à tona que existe uma ideia pré-concebida de quem e  que caracteriza a criação no meio digital e que por muitas vezes pessoas negras não são vistas como potenciais criadores e reformuladores de um espaço que se faz presente na sociabilização virtual atual de boa parcela da população mundial. Se por um lado enfrentamos obstáculos técnicos, financeiros e embarreiramentos perante olhares artísticos tradicionais, por outro enxergo a criação artística virtual como um grande leque de experimentação que permite a exploração e o uso de técnicas relativamente novas que não se enquadram necessariamente em uma regra intelectualmente racista e reducionista. É uma via de mão dupla, a dificuldade financeira existe e o racismo também está presente na esfera virtual mas me questiono o quanto não podemos reformular o presente a partir do que se constrói exatamente agora.
Vitória Cribb, W97M _ MELISSA, 2020. Curadoria de Felipe Barsuglia e Yan Coppeli
[TT]
Em uma conversa você comentou sobre uma carta que você escreveu para o algoritmo e que está inserida no seu trabalho @ilusão, desenvolvido na web residência do OLHÃO. Comente um pouco sobre o surgimento dessa carta e como ela se insere na obra.
[VC]
Sim, essa carta surgiu após um convite feito pela instância crítica O Turvo para uma publicação na segunda edição que tem como eixo temático os Regimes de Conexão. Enquanto elaborava as minhas proposições, o algoritmo me indicou a música Technologic - Daft Punk em uma plataforma de streaming. A partir daí comecei a refletir sobre a nossa relação e intimidade compartilhada com o algoritmo, aquele que nos conhece tão bem a ponto de nos redirecionar para supostas melhores opções baseadas nos nossos gostos pessoais, pesquisas recentes e acessos virtuais a partir da coleta de dados digitais. Na carta verso sobre imperativos que tange a execução corporal, orgânica e natural do ser humano de encontro com a tecnologia repetitiva. A carta se insere tanto no meu vídeo @ ilusão quanto na minha obra “Ouço ruídos nesse grande mar difuso inundado por imperativos invisíveis”, no primeiro caso a carta aparece como a textura de um grande oceano de imperativos assim como percorre o corpo da personagem principal. No segundo caso o texto é a própria escultura desse oceano de hiperativos. Aplicar elementos de um trabalho/momento sobre o outro e ressignificar o contexto diz tanto sobre a técnica digital quanto sobre o modus-operandi da nossa conexão virtual.
Vitória Cribb, [still] @ilusão – Video, 2020 Triha- OLHO
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Seu trabalho também se materializa fora do ambiente virtual, como você enxerga essa materialização em outro meio? Existe uma ponte entre o digital e o não-digital?
[VC]
Acredito que ambas as esferas estão correlacionadas tanto artisticamente quanto socialmente. Investigar o encontro de ambos os ambientes de forma conceitual e visual é explicitar o que já fazemos socialmente através das redes sociais, por exemplo. Encontros digitais e não-digitais em quase todas as esferas presentes na nossa vida.
Instalação desenvolvida no programa de Residência Futuros Possíveis com Direção Artística e curadoria de Gabriela Maciel e co-curadoria de Yasmine Ostendorf. EV Largo – Rio de Janeiro (maio – julho de 2020)
[TT]
Comente um pouco sobre seus projetos futuros, para onde você pretende direcionar o seu trabalho?
[VC]
Os últimos meses de 2020 foram bem intensos no que cerne a conceituação, experimentação e troca com curadores sobre a minha produção artística. Pretendo continuar as minhas investigações e formulações de projetos dentro de esferas que me permitam desenvolver e apresentar a minha expressão artística de forma verdadeira. A instalação artística física e virtual é um elemento bem presente no meu corpo de trabalho nos últimos anos e pretendo desenvolver e estruturar melhor alguns projetos instalativos/físicos que permeiam a minha mente em um futuro próximo sem abandonar o núcleo da minha produção que é o digital e sim incorporando esse elemento em formulações outras.

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